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João Marinho Filho, filho de João Marinho e Persantilha Muzzy Marinho, nascido no dia 05 de junho de 1930, no pequeno município de Trajano de Morais, localizado na região serrana do estado do Rio de Janeiro.

Professor João Marinho Filho, o Reverendo João, faleceu no décimo quinto dia de agosto de 2017.

Não há como entender a transformação do menino franzino e tímido em um fervoroso educador de mentes e de almas sem entender o poder fascinante que o conhecimento exerce nas crianças.

A natural curiosidade, a sensação de pertencer a um mundo maior que a realidade dura do trabalho no campo, efervesceram de forma branda, contínua, catalisadas pelo conhecimento emanado dos missionários presbiterianos. Algo tão intenso e disruptivo, que foi capaz de encorajar o coração de um pequeno filho de colonos. Pediu mais de uma vez que a família permitisse que frequentasse a escola. Queria muito estudar.

O pedido foi acolhido após o espanto inicial de toda a família, imaginando o quão desafiador seriam os pés descalços na estrada poeirenta, os quilômetros caminhados diariamente, a dificuldade de continuar ajudando no trabalho na fazenda, a melancolia ao perceber a falta de perspectiva de mudança social para um menino ilhado numa plantação de algodão, naquele pequeno município de Martinópolis, região da Alta Sorocabana.

A obstinação pelo conhecimento levou o menino João Marinho Filho ao tão almejado banco escolar. Finalizou os quatro primeiros anos do ensino fundamental com excelente desempenho. Embora aprovado no exame de admissão do Ginásio, não pôde continuar seus estudos. O recrudescimento da condição econômica da família o impediram.

A interrupção do seu sonho nunca foi esquecida. Esta frustração amarga na infância se traduziu na defesa ferrenha da escola pública, gratuita, de qualidade, cujo acesso fosse para todas as crianças. Incluía nesta concepção as “crianças mais velhas”, adultos iletrados pela ausência do acesso universal a educação. A falta de material escolar, uniforme, o trabalho infantil, jamais poderiam ser empecilho para a principal oportunidade de moldar o caráter do ser humano. Acreditava nisso com a força de sua fé.

Nunca desistiu, em momento algum de sua vida. Essa característica revelou-se novamente na retomada dos estudos, no Instituto Patrocínio, localizado em Minas Gerais. No início das aulas, um dos professores o interpelou, afirmando que dificilmente conseguiria finalizar o curso. Imaginava que aquele adolescente lavrador não possuía a formação inicial adequada. João finalizou o Ginásio com ótimas notas. Foi imediatamente aceito no Instituto José Manoel da Conceição, em Jandira, interior de São Paulo, onde completou o Clássico.

Neste momento, sua decisão pela vida religiosa e acadêmica se concretizara.

O Instituto Conceição foi o ambiente acadêmica perfeito para o jovem João Marinho. Era ligado à Igreja Presbiteriana, e oferecia aos estudantes uma grade curricular privilegiada para aqueles que tinham como objetivo estudos teológicos e filosóficos.

No ano de 1957, João Marinho Filho é admitido como aluno de Teologia no Seminário Presbiteriano de Campinas. Completou seus estudos após cinco árduos anos, que lhe trouxeram influências intelectuais dos professores presbiterianos. Gradualmente, a Educação se tornara uma grande paixão. Inspirado por Lutero e Calvino, líderes da Reforma Protestante no século XV, via o analfabetismo e o desinteresse pelo conhecimento como males a serem combatidos. Partilhava da mesma visão Rubem Alves, seu colega de curso e amigo.

Nos anos seguintes atuou como seminarista. Sua primeira incumbência foi como auxiliar do Rev. Avelino Boamorte no Presídio do Carandiru. Dedicava-se ao aconselhamento e ensino oferecido aos internos da instituição. Finalizado este período desafiador, enfim voltou ao interior de São Paulo, atuando em Rancharia, cidade pacata próxima a Martinópolis.

As viagens visitando igrejas no interior do estado de São Paulo eram constantes. No seu último ano como seminarista, conheceu uma jovem organista na Igreja Presbiteriana de Barretos. Foi apresentado a Martha de Andrade Barbosa, estudante de música e soprano. Soube que ela assumira a regência do coral daquela igreja, com peculiar afinco e competência. Tornaram-se amigos, namorados, noivos. Em junho de 1963, Martha acrescentou Marinho ao seu nome.

Estabelecem residência em Rancharia, após João Marinho aceitar o convite da pequena Igreja Presbiteriana daquela cidade. Um ano depois, o jovem casal recebe a primeira benção: nasce João Marcos, o primogênito. A Vovó Dina é convocada para auxiliar o jovem casal. Nos anos seguintes, a família cresce: Anael nasceu em 1965, em Rancharia. José Márcio e Márcia complementam o núcleo familiar em 1968 e 1969, mas nesse momento em casa nova: a família Barbosa Marinho já havia se estabelecido em Assis.

A Igreja de Assis refletia o paradoxo de uma típica cidade no interior de São Paulo que outrora vivera um período de prosperidade, sentira o golpe do declínio econômico, e se transformara em cidade universitária, fervendo de ideias e esperança no futuro, onde a tradição convivia com o contemporâneo. Neste cenário, João e Martha sentem o chamado da vocação de suas vidas: a Educação.

E nesse ambiente repleto de fé e paixão, João e Martha lutaram por seus sonhos. Ingressaram na Universidade de Assis, um campus avançado da USP, posteriormente absorvido pela UNESP. João Marinho no curso de Letras, e Martha no curso de História. Formaram-se em 1969, ano de nascimento da caçula Márcia.

Foi um período de bonança. João Marinho possuía uma energia que o fazia extrapolar os limites da atuação como pastor, sempre em busca de oportunidades que permitissem o exercício da fraternidade. O aconselhamento espiritual, o trabalho como professor, a atuação como clérigo da Igreja Presbiteriana, seu papel como pai e esposo, tudo convergia para o surgimento de projetos e ideias. Algo aparentemente pequeno como o estímulo ao hábito da leitura entre seus pupilos, ou o trabalho de assistência aos necessitados que buscavam atendimento médico, até a criação de um projeto de interação entre população de Assis e os índios Caroás, resultando em eventos culturais e doações de material hospitalar e medicamentos para o hospital indígena localizado em Dourados. Todas as ações eram valiosas.

Seu projeto maior em Assis foi a construção do templo da Igreja Presbiteriana. Sua capacidade de envolver a comunidade com harmonia despertou a atenção dos seus professores do seminário e dos líderes da Igreja Presbiteriana do Brasil.

No ano de 1972, a família Barbosa Marinho mudou-se para Jundiaí. João assumiu o púlpito da igreja central do Presbitério de Jundiaí. Sua atuação na educação tornou-se intensa, lecionando em escolas de Jundiaí e na Escola Técnica Federal, em São Paulo. Seu instrumento mais contundente era a leitura e a escrita. Estava convencido que a dispersão do conhecimento sempre se embasa na comunicação. Para ele, o estudo gramatical sem aplicação no desenvolvimento da argumentação e da interpretação, sem o enriquecimento do vocabulário, seria obsoleto. Assim como Lutero, sua luta tinha duas trincheiras: a fé e a leitura.

Os ventos no Brasil mudam, os cenários tornam-se inóspitos, e em 1976 João Marinho é convocado a assumir a Igreja Presbiteriana de Indaiatuba. Em 1977, a família Barbosa Marinho foi recebida pela congregação presbiteriana de Indaiatuba, sendo rapidamente integrada a pequena cidade agrária de outrora.

João Marinho costumava relembrar desse período inicial com especial carinho. Entre sorrisos, descrevia o susto dos alunos quando ele finalizou a primeira aula do ano propondo que “até o final do semestre, todos estariam lendo um livro por semana”. Nesse momento, ele recolhia seu riso e citava o seu real planejamento. Sua ambição maior sempre foi convencer os seus alunos quanto a utilidade da educação como ferramenta de mudança e de crescimento. O estudo deve ser a base de todo aluno, especialmente os carentes, na construção do projeto de vida.

Foi em Indaiatuba que João Marinho atuou intensamente como professor. Randolfo Moreira Fernandes, Hélio Cerqueira Leite, Dom José de Camargo Barros, Camilo Marques Paula, Helena de Campos Camargo. Todas escolas tradicionais em Indaiatuba, nos áureos tempos quando a escola pública era líder na educação do nosso país.

É de suma importância lembrar o ensino público enfrentou o recrudescimento da situação socioeconômica no final da década de 70 e por toda a década de 80. O refluxo do Milagre se traduziu em desabastecimento, desemprego, desesperança. As escolas eram o pilar do sonho de um Brasil grande, melhor, mais justo. Como sempre, João Marinho se manteve firme no seu propósito, participando de grupos de trabalho e estudos sobre o ensino do Português e da Literatura, seja no mestrado na USP ou no projeto de reformulação que aconteceu na UNICAMP.

Decorridos seis anos, no dia 23 de outubro de 1983 foi inaugurado o novo Templo da Igreja Presbiteriana Unida de Indaiatuba. João Marinho sentia que cumprira mais uma etapa da sua missão. Mas a condição social de inúmeros alunos na rede pública era preocupante. O fluxo migratório trouxera novos indaiatubanos que necessitavam de amparo. Nesse contexto, a atuação do Professor João foi muito além das fronteiras das escolas. Participou da criação da creche “Amiguinhos de Jesus”, em 1986, a qual oferecia ajuda às mães residentes do Jardim Morada do Sol. Foi membro do Conselho Tutelar, um período de atuação social e reflexão ao se deparar com a realidade dura da desintegração de estruturas familiares.

Inquieto com os rumos da educação, se aposenta na rede estadual de ensino. O ano era 1988, quando se comemorou o Centenário da Abolição da Escravatura no Brasil. A Secretaria Municipal da Educação o convocou para escrever uma peça comemorativa sobre a efeméride. Pensou pouco e concordou. O resultado foi a publicação de “Libertação? Quando? ”, um ensaio crítico sobre o modelo de abolição que não criou condições para a efetiva emancipação e aceitação dos afro-brasileiros, refletindo sobre alternativas para a correção da realidade atual. O modelo dessa obra resumiu sua atuação como docente: leitura e escrita analítica, senso crítico, postura construtiva.

O final da década de 80 lhe reservou momento repletos de felicidade e outros de consternação e resignação. A imensurável alegria de graduar seus dois filhos mais velhos se contrapôs ao período de enfermidade. Grave cardiopatia o acometeu, que por pouco não lhe custa a vida. Se recuperou plenamente, e ganhou um grande amigo, Dr. Celso Sallum. Pouco tempo depois, o diagnóstico de um tumor de próstata. Pragmático, se submeteu aos tratamentos. Como costumava dizer, fez um acordo com Deus, pois precisava trabalhar mais e acabar sua principal missão: graduar todos os filhos na universidade.

Ciente de suas limitações que a saúde lhe infligiu, assumiu a Igreja Presbiteriana Unida do Jardim Califórnia, comunidade que manteve um especial afeto. Foi nesta comunidade que se envolveu com outros voluntários sonhadores no Projeto “Ágape”, voltado a oferecer educação complementar, incluindo atividades artísticas e culturais, que atraísse para um ambiente mais seguro e saudável crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social.

Sua atuação como pastor e educador continuou até 2011. Até onde possuiu forças para subjugar sua condição clínica que recrudesceu progressivamente.

Costumava dizer que sua obra como educador foi completa por ter conseguido oferecer a todos seus filhos a maior e melhor herança: a possibilidade de estudar.

Faleceu aos 87 anos, na cidade de São Paulo, com sua esposa Martha ao seu lado.

Foi sepultado em Indaiatuba, conforme seu desejo, em um dia de céu azul e vento cálido.

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